segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Ministério Público do Espírito Santo entra com Ação Cautelar contra Rio - PCH e contra o IBAMA

Leia abaixo o texto na íntegra que foi publicado no Diário Oficial que reflete a situação e sentimento da população a respeito das enchentes na região

A Ç Ã O C A U T E L A R
O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, no exercício da CURADORIA DO MEIO AMBIENTE E DA CIDADANIA, vem, com arrimo no artigo 37, § 4º e § 5º; artigo 129, inciso III; todos da Constituição Federal; na Lei Federal nº 7.347/85; artigo 25, inciso III, alínea “b” da Lei Federal nº 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público); artigo 35, alínea “m” da Complementar nº 95/97 (Lei Orgânica do Ministério Público Estadual); e artigos 282 e seguintes, do Código de Processo Civil, vem propor a presente instruída com os documentos anexos, em face, respectivamente, das Pessoas Jurídicas de Direito Privado e Público, abaixo indicadas:
PERFOMANCE CENTRAIS HIDRELÉTRICAS – PCH / RIO, CNPJ nº 02.939.231/0001-90, com endereço na Av. São Luís, nº 192 – sobreloja 8 – Centro / Município e Comarca de São Paulo - SP (CEP.: 01.046-913) (tel.: 0xx11 3123-3030 / Fax.: 0xx11 3135-3132; e

INSTITUTO BRASILEIRO DE MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA, representado pelo Doutor Leozildo Tabajara da Silva Benjamin, Coordenador Geral de Infra-Estrutura de Energia Elétrica, com endereço em SCEN, Trecho 02 / Setor de Clubes Esportivos, Ed. Sede – Brasília / DF (CEP.: 70.818-900 / Município e Comarca de Brasília – DF (Tel.: 0xx61 3316-1000 / Ramal 1595) (URL: HTTP://www.ibama.gov.br
Para tanto, aduz os seguintes fatos e fundamentos:
I – DAS ENCHENTES DE PROPORÇÕES CATASTRÓFICAS –

Como vem sendo veiculado em toda imprensa, inclusive em nível nacional, a região do Distrito de Ponte do Itabapoana, neste Município e Comarca de Mimoso do Sul-ES foi recentemente assolado por cheias do Rio Itabapoana jamais registradas na história capixaba.

Tal potência extrema das cheias nas diversas localidades próximas ao Rio Itabapoana, causou danos irreparáveis para a população mimosense; notadamente aquelas residentes no Distrito de Ponte do Itabapoana, povoados existentes no entorno e até mesmo moradores das zonas rurais do Município de Mimoso do Sul.

A infausta surpresa denotou um absurdo desamparo para com a população atingida que ficou lançada à própria sorte; sem meios dignos para abrigamento, refúgio e proteção diante das intempéries.

Cidadãos que antes, jamais haviam sido alcançados em suas residências pelos efeitos dessas enchentes, viram-se arrasados pela enxurrada borbulhante que lhes deixaram atônitos e sem mecanismos para escape.

Revelou-se claramente um total descaso e falta de previsibilidade dos segmentos envolvidos para propiciar medidas emergenciais, socorristas e humanitárias.
Os meios rodoviários de acesso ao Distrito de Ponte de Itabapoana ficaram totalmente interrompidos e os seus dignos moradores isolados, no caos.
Estranhamente, inclusive a rodovia asfáltica que liga a sede deste Município (Mimoso do Sul-ES), através da BR-101, até o Distrito de Ponte do Itabapoana-RJ, ficou intransitável por conta da cheia que a cobriu, impedindo o fluxo de carros e pessoas.
Uma lástima ! Um só desespero para quem mora em Ponte do Itabapoana, nesta Comarca.

E a questão não foi somente naquele Distrito, tanto que os Municípios próximos de Apiacá-ES, Bom Jesus do Norte-ES e Bom Jesus do Itabapoana-RJ – também guarnecidos com o curso do Rio Itabapoana – foram duramente atingidos com a profusão de águas pluviais; sofreram cheias de monta inimaginável ao longo de suas histórias.
De se registrar que o Rio Itabapoana flui, ou seja, tem seu curso justamente no sentido de Bom Jesus do Itabapoana-RJ, passando pelo Distrito de Ponte do Itabapoana, neste Município e Comarca.

II – DA CONSTRUÇÃO DO COMPLEXO HIDRELÉTRICO DO RIO DO ITABAPOANA – “PEDRA DO GARRAFÃO” –


O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, através desta Curadoria do Meio Ambiente, observando, pessoalmente - bem antes da tragédia que se abateu com as severas cheias na região – a construção de uma hidrelétrica na localidade denominada “Pedra do Garrafão”, justamente com aproveitamento do manancial do Rio do Itabapoana, neste Município; expediu alguns ofícios à primeira e segunda requeridas, justamente no sentido de obter documentos técnicos sobre as avaliações acaso procedidas.

Notoriamente, obras invasivas como a que se desenvolve importam em modificações significativas no meio ambiente; particularmente quando implicam no “represamento” de um rio, mesmo com o fim de geração de energia elétrica, como parece ser o caso.
Em resposta, os requeridos enviaram os projetos e estudos em anexo – doravante instruidores desta Cautelar – onde trazem inúmeros dados técnicos sobre a obra.
Todavia, nenhum deles apresenta uma análise conclusiva sobre os impactos em termos de enchentes e/ou agravamento de represamento de águas pluviais com inundações de casas, povoados, plantações, pastagens, cidades etc.

Tanto pior, os requeridos não apresentaram qualquer estratégia ou contingenciamento para aplacar as gravíssimas conseqüências dessas cheias; deixando transparecer que a população mimosense e adjacentes deverão ficar ao “Deus-dará”.

Não consta nos estudos apresentados, ainda, quais as conseqüências e correlações entre as obras da hidrelétrica na “Pedra do Garrafão” (Rio Itabapoana) e as cheias que provocam enchentes nas cidades e povoados existentes às margens do manancial.

Um completo absurdo e descaso com a população!

III – DAS PROGNÓSTICOS ASSOMBROSOS –

Tem sido hodiernamente veiculado pela mídia – e também se pode confirmar através de sites especializados em meteorologia – que o verão 2008/2009 será de chuvas intensas em toda região SUDESTE.

O drama vivenciado pelas famílias de Ponte do Itabapoana e demais cidades circundantes tem chances reais de se repetir.

O Poder Público não pode se calar. A sociedade civil deve estar mobilizada e exigir seus direitos.

Impõe-se esclarecer – COM URGÊNCIA – se as operações desenvolvidas pela primeira requerida na localidade de Ponte do Itabapoana (Pedra do Garrafão), afetam o escoamento natural do excesso de água que faz o Rio Itabapoana transbordar.
Igualmente, é dever se reclamar da segunda requerida que exerça sua atividade fiscalizadora e redimensione todo o estudo sobre a construção em andamento, verificando se há ou não reflexos em termos da severidade verificada na enchente recente que arrasou o Distrito mimosense.

IV – DO FUMUS BONIS IURIS–

O pedido cautelar que ora se encaminha, está fortemente alicerçado na Constituição Federal, porquanto envolve a proteção à vida, á dignidade dos moradores cujos lares margeiam o Rio Itabapoana.
Não é justo e razoável que pessoas fiquem dia e noite sobressaltadas, vendo as chuvas torrenciais e incessantes como risco real de nova enchente.

Fatores climáticos existem e já se mostram diferenciados na atualidade; contudo, não se pode conviver com a dúvida diante de uma obra grandiosa como a que a primeira requerida desenvolve; impactando o ambiente e, coincidentemente ou não, ocorrendo num momento em que uma mega-enchente devastou toda região.

O pânico é geral ! A população não tem a quem reclamar, é fato.

É diante desse quadro que se mostra escorreito exigir dos requeridos providências técnicas e socorristas EMERGENCIAIS.

V – DO PERICULUM IN MORA –

Há sim o risco de perdimento de vidas, de proliferações de doenças próprias do “pós-enchente”, de destruições de casas, desalojamentos e desabrigamento de cidadãos.

Inaceitável esperar nova catástrofe para agir.

O Estado-Juiz deve impor à primeira requerida, na condição de concessionária de serviço público, que atenda aos princípios da Administração Pública; entre os quais, de se destacar o da EFICIÊNCIA, permitindo e, ela própria, realizando, estudo urgente, para avaliar o impacto dessas enchentes em razão das obras que vem realizando no Rio Itabapoana.

E não só isto, cabe o segundo requerido, pela sua função fiscalizadora, destacar uma avaliação técnica de urgência para verificar os meios necessários para corrigir possíveis distorções e impedir que a tragédia se repita.
Coroando tudo isto, impõe-se que a primeira requerida organize uma sistemática de atendimento emergencial da população acaso atingida por nova enchente; obviamente se demonstrada a relação entre a intervenção que desenvolve e as conseqüências com as cheias do Rio Itabapoana.

Não se pode admitir, portanto, que a negação desta Cautelar venha resultar em máculas com sucessivos reflexos e impossibilidade futura de correção.

Por todo o esposado, o MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, por meio de sua PROMOTORIA DE JUSTIÇA GERAL R E Q U E R a concessão de MEDIDA CAUTELAR, destinada a:

a) DETERMINAR QUE A PRIMEIRA REQUERIDA REALIZE, EM 05 (CINCO) DIAS, CONTADOS DA CIÊNCIA DESTA CAUTELAR, ESTUDO TÉCNICO DE EMERGÊNCIA, CORRELACIONANDO OS SERVIÇOS E OBRAS JÁ REALIZADAS NO RIO ITABAPOANA (PEDRA DO GARRAFÃO) COM AS CHEIAS RECENTES QUE ALAGARAM O DISTRITO DE PONTE DO ITABAPOANA E DEMAIS POVOADOS QUE MARGEIAM O RIO ITABAPOANA;

b) AINDA, QUE A PRIMEIRA REQUERIDA, A PARTIR DA IDENTIFICAÇÃO DAS POSSÍVEIS CAUSAS PARA OS REPRESAMENTOS OU ENTRAVES NO FLUXO NORMAL DO RIO ITABAPOANA, REALIZE SERVIÇOS EMERGENCIAIS PARA ASSEGURAR A FLUÊNCIA OU LIBERAR QUALQUER ENTRAVE NA PASSAGEM DO MANANCIAL;
TAMBÉM, QUE A PRIMEIRA REQUERIDA SEJA INSTADA A ESTABELECER, EM (05) CINCO) DIAS APÓS A RESPOSTA AFIRMATIVA À QUESTÃO DA ALÍNEA “A”, ESTRATÉGIAS CONCRETAS PARA, EM CASO DE NOVAS ENCHENTES, PROMOVER O SOCORRO DIRETO DAS FAMÍLIAS ATINGIDAS, a) DESTINANDO ABRIGAMENTO, ALIMENTAÇÃO, TRANSPORTE E PRIMEIROS SOCORROS; E

b) DETERMINAR QUE A SEGUNDA REQUERIDA, EM 10 (DEZ) DIAS, DETERMINE O ACOMPANHAMENTO TÉCNICO DOS ESTUDOS A SEREM REALIZADOS PELA PRIMEIRA REQUERIDA, IDENTIFICANDO A INCIDÊNCIA OU NÃO DE FATORES DETERMINANTES PARA AS CHEIAS SEVERAS E RECENTES NO RIO ITABAPOANA.
Pede-se, ainda, que Vossa Excelência estabeleça MULTA DIÁRIA no valor de R$100.000,00 (cem mil reais), incidente sobre o PRIMEIRO REQUERIDO, cuja execução será promovida ao final de cada 30 (trinta) dias, pelo Órgão Ministerial.

O valor da referida multa será revertido para o Fundo Estadual dos Direitos Difuso, in forma legis.

Seja, após a concessão da MEDIDA LIMINAR, intimados de imediato os Requeridos para atendimento da ordem.

Face à natureza da matéria e diante da gravidade da situação, pede-se o encaminhamento de cópia do presente à Coordenação de Defesa Civil Estadual, ao Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos - IEMA/ES e à Associação de Moradores do Distrito de Ponte do Itabapoana, nesta Comarca.

As medidas pleiteadas nesta sede cautelar não afastam outras que poderão ser formuladas, bem como não se prestam a qualquer tipo de compensação ou substituição.

Dá-se à presente, apenas para fins fiscais, o valor de R$100.000,00 (cem mil reais).

Mimoso do Sul-ES, em 28 de dezembro de 2008.

Fábio Baptista de Souza
Promotor de Justiça
“Curador do Meio Ambiente e da Cidadania”

Um comentário:

Anônimo disse...

Meus parabéns pela iniciativa do Drº Fábio, é muito triste ver pessoas desta comunidade tão carente sofrendo e sem mais nada a esperar.Que a resposta desta liminar seja logo atendida e favorável.

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